Autor: Pedro Paulo Paulino

Atuante tanto na literatura de cordel quanto na poesia erudita, com diversas conquistas em prêmios literários de âmbito nacional. Além de seu trabalho como escritor, ele também é redator e diagramador de jornais, revistas e livros, atuando dentro e fora de Canindé. Como radialista, Pedro Paulo apresenta um programa aos domingos, focado em resgatar sucessos da Velha Guarda.

Embora apostador bissexto, aqui acolá arriscando algum trocado no milhar, confesso mesmo que tenho um motivo remoto para não me maldizer da tentativa. Eu ingressava na maioridade, quando, uma sexta-feira, tirei do bolso uma nota verde de um cruzeiro e arrisquei no milhar do cachorro, que, diga-se de passagem, dos 25 bichos é o que mais dá prejuízo aos banqueiros. Foi batata. À noite, quando correu o jogo, deu o milhar inteiro na cabeça, e a nota de um cruzeiro multiplicou-se em quatro mil. A bufunfa foi suficiente para comprar a máquina fotográfica dos meus sonhos, por esse tempo, uma…

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Os três personagens que emprestam seus importantes nomes às festas juninas brasileiras não são nossos patrícios. Todos eles nasceram muito longe daqui e em épocas muito distantes. Mas granjearam tanta simpatia e graça do povo brasileiro, em particular no Nordeste do país, que é mesmo como se fossem filhos desta terra. O primeiro deles, Antonio de Lisboa e de Pádua, foi um europeu, contemporâneo de Francisco de Assis, e viveu, portanto, entre os séculos doze e treze, muito antes da chegada das caravelas portuguesas no Brasil. É para ele que se acende a primeira fogueira festiva de junho: quer no…

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É assim que os cearenses chamamos o encerramento da quadra chuvosa, de janeiro a junho, quando não há seca. Eu não esperava encontra-la no Aurélio, mas eis que lá está, dicionarizada pelo mestre do pai-dos-burros. “Bras. CE – O fim da época chuvosa, em junho”, sintetiza o léxico. Desmembrada a expressão, temos dois substantivos e uma preposição no meio, que no dicionário foram aglutinados e viraram um único substantivo masculino plural. Fins-d’água tem sua genealogia no nosso linguajar caboclo. É patrimônio do nosso cearencês. Brotou do espírito do povo, mestre em criar seus próprios verbetes e expressões, nos quais expressa…

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O último dia de maio do ano 2020 significou também os últimos instantes de Arievaldo Viana. Na manhã daquele sábado começou a circular a dolorosa notícia da morte do artista múltiplo, no vigor dos seus 52 anos de idade. O choque emocional foi coletivo, tornando mais sinistros aqueles dias já tão cheios de sofrimento e dor, diante das notícias da perda de um sem-número de pessoas levadas seguidamente pela terrível pandemia que dominou o planeta inteiro. Embora não se tenha contaminado pelo vírus mortal, outra enfermidade subtraiu do nosso convívio um dos mais fecundos talentos, deixando enlutado o conjunto de…

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Chamava-se Fátima. Morreu em tenra idade, em 1974. Podia ter sido um anjinho como tantos outros de sua época, quando a mortalidade infantil ainda acontecia em larga escala. Podia também ter sido enterrada numa encruzilhada, caso fosse pagã, como mandava a tradição. Pois até não muito tempo atrás, no pensar de uns, as crianças que morriam sem o batismo não eram dignas de ser enterradas no cemitério, mas numa encruzilhada, via de regra formada pelas veredas sertanejas, e seu espírito subia para o limbo, um lugar neutro, nem céu nem purgatório. Já outros acreditavam que a criança morta e pagã,…

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No dia 13 de maio fez 30 anos da morte do professor Laurismundo Marreiro. Estudantes secundaristas dos anos de 1980 encontramos no Professor Laurismundo um ponto de referência especial. Mestre em língua inglesa e professor de educação física, ele era, além disso, incentivador incansável da cultura, das artes e dos esportes. Em torno de sua inteligência, convergiu um grupo de jovens canindeenses com sede de leitura, literatura, educação e conhecimentos. Era sempre com ansiedade que, em sala de aula, esperávamos a vez do Láuris ou o “Teacher”, como carinhosamente o chamávamos. Com frequência, a disciplina propriamente dita cedia lugar a…

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A escrivaninha onde está o notebook em que agora escrevo foi fabricada faz muito tempo. Uma pequena mesa revestida de fórmica vermelha. Embora antiga, seu estado de conservação e integridade física nos dão a entender que foi feita ontem. Isto porque, além do zelo que lhe tenho, convém afirmar que cada peça de mobília fabricada na movelaria Zezé Alves, na cidade de Canindé, tinha a qualidade de durar por tempo indeterminado. Além da escrivaninha, há aqui perto de mim outros móveis construídos naquela oficina. Para melhor dizer, era talvez contada a casa, na cidade e povoações, pelos idos dos anos…

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Caminhando pela rua, numa dessas manhãs ensolaradas, de súbito veio-me à lembrança a figura de um personagem típico da paisagem urbana, e hoje em dia quase desaparecido: o vendedor de picolé. Aquele mesmo que, infatigavelmente, empurrava o carrinho anunciando, com voz rasgada: “Ó o picolééé!” “Ó o picolééé!”. E completava o reclame com a lista de sabores: “ Tem picolé de coco, abacate, morango, leite, creme, maracujá, abacaxi…”. E seguia, rua arriba, rua abaixo, empurrando o carrinho de duas rodas, repleto de picolé, numa faina constante. Dentre todos, um conheci, com seu boné meio atravessado na cabeça e um sorriso…

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Comemorou-se em 23 de abril o Dia Mundial do Livro. A efeméride trouxe-me à lembrança o vulto anacrônico de um vendedor ambulante de livros, perfilado por mim nesta crônica. Eu só o vi uma vez, em 2017, durante os festejos religiosos de Canindé. Pequenas montanhas de livros expostas no porta-bagagem aberto do carro. Um outro tanto espalhado na calçada, bem no centro comercial da cidade, em meio aos transeuntes, quase todos indiferentes. Volumes usados, de literatura, história e também livros técnicos, afora revistas e outras publicações. Velhas enciclopédia e coleções. Enquanto eu passava em revista o estoque e adquiria alguns…

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Encontrei-a em algum dia do ano de 2019. Filhotinha, abandonada e cega. Foi num restaurante, onde eu acabava de sentar para o almoço. E ouvi, distante, um miado, mais um grunhido do que um miado, ali por perto da minha mesa. Suspendi os talheres e agucei a audição, para identificar de onde vinha aquele pedido de socorro. Até que localizei a origem. Era um filhote de gato, abandonado, que parecia mais um rato de esgoto. Botei pedaços de carne no chão. O garçom chega e diz: “ele não vai encontrar a comida, porque é cego”. Coloquei-o então em cima da…

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